ATRIBULAÇÕES DE UM
ESPÍRITA DESENCARNADO
Pela primeira vez, após seu desencarne, Eustáquio
manifestava-se pela psicofonia mediúnica, no grupo de trabalho ao qual estivera
vinculado durante 25 anos, nos labores da Caridade. Euforia e emoção!... O
companheiro desencarnado fora abnegado servidor e grande amigo de todos.
- Meus queridos –
saúda, emocionado o visitante, pela psicografia mediúnica. – Grande é minha alegria, de retorno à nossa
convivência. Ainda não estou na plena posse de minhas forças, nem treinado para
este intercâmbio. Posso adiantar, entretanto, que tudo o que aprendemos com
nossa amada Doutrina Espírita é a expressão da realidade, principalmente no que
se refere ao serviço do Bem, que é sublime semeadura para a Vida Eterna,
favorecendo um retorno feliz à Espiritualidade. Embora pouco o que fiz, recebi
preciosas compensações...
Após ligeira pausa, Eustáquio imprime leve traço de tristeza
em suas palavras, dizendo:
- Entretanto, minha
situação espiritual não é das melhores, porquanto se algo realizei em benefício
do semelhante, fui muito descuidado em relação ao meu próprio Espírito. É relativamente
fácil trabalhar pelo bem alheio; difícil é impedir o mal em nós mesmos. Não há
dificuldade em orar por alguém, visitar um doente, pronunciar palavras de conforto
e estímulo, atender o necessitado... Difícil é conter a irritação, evitar a
maledicência, exercitar o perdão, abortar a má palavra... Semelhantes impulsos
estão muito arraigados em nosso coração! E há os vícios... Incrível! Nem tenho
conta das manifestações que presenciei de entidades desencarnadas a lamentar os
excessos à mesa, os desregramentos, o álcool, o fumo, o tóxico... E eis-me aqui
a engrossar o coro dos atormentados do Além, porque jamais levei a sério as
advertências contidas naqueles dolorosos depoimentos!...
- Ora, Eustáquio, não
se torture - diz conciliador o companheiro Breno. – Afinal, ninguém é perfeito...
- Sim, eu sei, eu
sei... Todos têm fraquezas, mas ante as bênçãos do conhecimento espírita, há a
obrigação de combatê-las. Enquanto permanecemos na escuridão ninguém pode nos
criticar se tropeçamos, mas quando a luz se faz, cumpre-nos olhar por onde
andamos. Nada posso fazer senão lamentar o tempo perdido, mas vocês permanecem
na luta. Aproveitem as oportunidades; não percam tempo, aprendam a se analisar,
olhem dentro de si mesmos. Vejam o que deve ser mudado e o façam, a fim de não
colherem decepções idênticas às minhas... O título de servidor do Evangelho é
importante: habilita-nos a muitas bênçãos, mas somente como discípulos
autênticos do Cristo estaremos construindo, realmente, nossa felicidade. Isso
pede não apenas a movimentação de nossas mãos pelo solo promissor da
Fraternidade, mas, sobretudo, de nossa vontade, a trilhar com decisão árduos
caminhos do aprimoramento espiritual.
O amigo desencarnado despede-se e a
reunião é encerrada. Naquela noite não houve, como de costume, comentários em
torno da manifestação. Todos meditavam, impressionados, sobre as graves
advertências recebidas, sentindo que se desencarnassem naquele dia não estariam
em melhor situação.
O conhecimento espírita é bênção de esclarecimento e
orientação. Amenizando as agruras da jornada humana e estimulando-nos à
movimentação pelo solo da Fraternidade, onde colhemos flores de Esperança e
frutos dadivosos de trabalho enobrecedor.
Mas, representa, também, intransferível acréscimo de responsabilidade
no campo do aprimoramento individual, partindo do princípio evangélico de que
muito será solicitado àquele que muito recebeu.
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Do livro “Atravessando
a rua”
Richard Simonetti
Cap. 32, página 109
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